quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Mensagem de Natal da Presidente do Blogue e O que andamos a ler

Tenho imensa vontade de falar sobre o paradoxo da classe que avalia não querer ser avaliada e da estranheza que me causa 13 mil pessoas aceitarem fazer um exame e depois serem os controladores dessa prova (e já detentores dessa profissão) a fazerem greve apesar de não se ter conseguido organizar um boicote.

Tenho imensa vontade de vos contar sobre um acidente de viação em que um carro está parado mas ainda assim o condutor do carro em movimento insiste não ter culpa de nada e partir deste fait-diver do quotidiano para um ensaio sobre a educação e o respeito que nos falta tanto a nós portugueses, quase todos, safados.

Mas não. Estamos no Natal e venho cá dizer-vos que 'O que andamos a ler' é 'A noite de Natal' de Sophia de Mello Breyner Andresen e mais uma vez confirmo que os pequenos são capazes de reconhecer a beleza da literatura, das suas camadas e das suas músicas de palavras, da forma mais simples, quando se emocionam com uma frase ou uma ideia.



Devo agradecer a escritores como estes, não só por nos contarem histórias belas, como por nos sustentarem a verticalidade da coluna quando às vezes, ou muitas vezes, temos vontade de tentar fazer como os outros. Mas nessa altura os nossos filhos não seriam os nossos filhos. Obrigada Sophia!

Feliz Natal.

terça-feira, 5 de novembro de 2013

O negócio da educação

A jornalista Ana Leal, como nos vem habituando, põe o dedo na ferida: o negócio da educação, a passagem dos detentores de cargos públicos a diretores de colégios... e o financiamento contínuo de escolas privadas desnecessárias (de acordo com os critérios do financiamento do MEC) ao lado de escolas públicas a cair de podre.

 

Como diz hoje, na TSF, Fernando Alves: será que não cai nem uma jarra na 5 de Outubro?

quarta-feira, 16 de outubro de 2013

No Dia da Alimentação, eu fui à escola

Eu sou gulosa. Mas quanto mais leio e escrevo sobre saúde, mais confirmo uma suspeita que tenho há muito tempo: a maioria das doenças tem origem na alimentação desequilibrada. Exemplos? Diabetes, hipertensão arterial, cancros vários, disfunção renal… mete medo.
(...)
Hoje é o Dia Mundial da Alimentação e foi este o pretexto para ir falar do açúcar na escola que os meus filhos frequentam.
(...)
Partilho aqui algumas das coisas que mais efeito surtiram entre os meninos e as meninas que me ouviram:

- “O açúcar faz mal aos dentes, mas se lavarmos muito bem os dentes não é muito grave. Mas alguém tem uma escova que lave a garganta, o estômago e os outros órgãos por onde passa o açúcar que comemos? Aí é que está o problema.”

A história completa podem lê-la em http://www.luxwoman.pt/dia-mundial-da-alimentacao/

terça-feira, 1 de outubro de 2013

Isaltino ou a sorte de um amor tranquilo


 
As pessoas fazem contas. As pessoas pagam os mesmos impostos que os vizinhos e têm uma vida melhor. As pessoas sabem, porque lhes dizem, que todos os políticos são corruptos, que a justiça não é cega e que a comunicação social serve interesses obscuros. As pessoas fazem as contas. As pessoas votam no que já conhecem e que sabem que resulta bem para a sua própria vida. De seguida ouvem os moralistas e os intelectuais ofendidos e surpreendidos. Só que os moralistas vivem em concelhos sem trabalho, com barracas… e eles não.
As pessoas fazem as contas, porque hoje são só as contas que interessam.

sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Reclamação construtiva

 
 
O meu filho X submeteu-se a vários exames auditivos no Hospital D. Estefânia, de acordo com prescrito anteriormente numa consulta de otorrinolaringologia, que duraram cerca de 10 minutos, depois de bastantes mais à espera de consulta, e com uma interrupção pelo meio. Tudo procedimentos normais dos quais não me queixo.
 
Queixo-me da sugestão para levar o X ao psicólogo feita pela técnica que estava a fazer os exames que, como referi acima, demoraram 10 minutos. A razão apontada: dificuldades de concentração.
 
O X tem 5 anos, é uma criança e não deveria ser preciso dizer mais nada. Mas eu digo: é uma criança normal, curiosa e que adorou o vosso laboratório de audiometria que tem auscultadores, luzes e maquinetas que ele nunca tinha visto!
 
Gostava de saber se parece razoável a alguém que uma técnica de audiometria possa fazer também uma avaliação psicológica e... em 10 minutos. Espero que quem receber esta reclamação perceba que não estou ofendida, na medida em que, felizmente, sei quem é o meu filho e confio plenamente nas avaliações que a escola que frequenta faz dele regularmente. Mas conheço alguns pais e profissionais de saúde para quem esta simples afirmação em contexto hospitalar iniciará facilmente um breve caminho até à hiperatividade, ao deficit de atenção e à medicação.
 
E é por isso que vos dou nota do acontecido. Esperando que sirva esta reclamação para que tal não ocorra novamente.
 

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Da escola: não querer ser professor

A minha licenciatura era vocacionada para o ensino - ensino de português língua materna com sua gramática e literatura para as criancinhas e adultos que frequentassem o ensino secundário em Portugal ou em português no estrangeiro. Era a saída mais evidente ou a entrada no mercado de trabalho mais direta do curso de Línguas e Literaturas Modernas, variante estudos portugueses.

No meu ano havia 4 bons alunos, daqueles que se destacavam mesmo pelas notas muito boas, pela noção de encantamento que nos devia causar a leitura de um poema e pela capacidade de pensar e relacionar as matérias do programa curricular com as demais matérias da vida.

Desses 4 alunos que se destacavam pela positiva num curso vocacionado para o ensino, hoje nenhum é professor do ensino secundário em Portugal. A Cláudia deixou os estudos literários a meio do curso para se dedicar ao Conservatório de Teatro e hoje escreve e dirige peças de teatro acutilantes e reconhecidas pela crítica. O Diogo seguiu para o Conservatório depois da licenciatura e do convite para integrar o mestrado em Linguística e, a última vez que o vi, era ator. O Pedro mestrou em literatura portuguesa, constituiu uma escola de artes e escreveu já vários livros, o último recentemente publicado, Despaís, é um livro do caraças, isto é, um livro que todos os portugueses e todos os cidadão de países em crise deviam ler.

Quanto a mim, escolhi não ser professora por duas razões: teria de estudar mais dois anos até poder exercer a profissão (um ano para pedagógicas com exigência de presença diária, coisa impossível para mim que já trabalhava, e um ano de estágio numa escola) e teria para sempre um mau patrão (lembro-me de ter dito isto tal e qual). Era o ano da graça de 2001.

Desde há 12 anos, eu tive dois contratos de trabalho sem termo, 2 anos de contrato com termo certo, com dois anos de desemprego interpolados por recibos verdes. Fui enganada algumas vezes, tive de andar a choramingar para conseguir cobrar muitas mais e a fazer trabalhos muito diferentes do que a minha ocupação principal faz prever. Tive meses em que não ganhei um tostão e outros em que ganhei tão mal que não chegou para as despesas.

Nunca me arrependi da decisão de não ser professora. Porque se fosse, tinha andado pelo país de mala às costas, ganhando uma ínfima parte do dinheiro que já ganhei até hoje, reduzida para sempre ao estatuto de aluno Erasmus cá dentro, dividindo casas com gente estranha, incapaz de construir uma família, ou vendo os filhos crescer aos fins-de-semana, continuando a ler apenas no comboio de regresso a casa, levando pancada da primeira mãe cujo filho eu repreendesse, sendo gozada por profissionais medianos de outras profissões que me diriam: ‘és professora porque não arranjaste mais nada para fazer?’ e não conseguindo nem uma vez uma contratação por mais do que um ano, não por fim da necessidade do meu trabalho, mas porque é assim o sistema, sendo alvo da chacota dos alunos que eu sentisse a necessidade de chumbar porque as passagens administrativas de multiplicaram ao extremo.

Eu acho estranho que um país não queira aproveitar para o ensino da sua língua materna, da sua cultura, os seus melhores alunos. Como nós os 4 deve haver mais mil que desistem de ensinar no liceu por motivos alheios à docência. Mas pelos vistos sou só eu que acha estúpidas a vida dos professores, as obrigações destes e a sua relação com a entidade patronal. Para o Ministério da Educação tudo vai bem e não é de agora.

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Está tudo bem

É só para avisar que está tudo bem. Que o texto Os valores da fome fala de toda a gente, não fala de mim em particular. Simplesmente, mesmo estando em contraciclo - feliz no emprego, etc - e com menos medo do futuro continuo preocupada com o que se passa à minha volta.
Obrigada a todos os que se preocupam comigo!

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Os valores da fome

Ao cuidado e atenção da dra. Dulce Rocha,

(vice-presidente do Instituto do Apoio à Criança que disse “a crise não pode servir de desculpa para os maus tratos às crianças”, “os valores têm de se sobrepor. Nós não podemos agredir uma criança porque estamos preocupados” quando comentava na antena da TSF o estudo do Núcleo Hospitalar de Apoio à Criança e Jovem em Risco que documenta o aumento dos maus tratos a crianças em Portugal, “aponta a negligência como o mau trato mais frequente. Desde a negligência passiva, em que as famílias não conseguem dar resposta às necessidades básicas dos mais novos, à negligência ativa, com intenção de provocar dolo e danos” lê-se na notícia.)

Quando decides ter um filho é sinal que tens esperança no futuro. Quando não tens esperança, já depois de teres sido afetada pelo desemprego e pela pobreza, ter um filho é um peso. É um peso. É horrível dizer isto, mas o filho que fizeste nascer não tem futuro, é assim que te sentes. Se tu que és mais alta, mais velha, mais forte não vês futuro, já perdeste a esperança, como podes acreditar que há esperança para o pequeno que tens na mão? Como é que podes acreditar que depois de te esforçares, de teres trabalhado 10 ou 20 ou 30 anos e teres ficado sem nada, depois de perderes pouco a pouco a eletricidade, o banho diário, a casa, a comida, a privacidade, a dignidade, como podes acreditar que ele tenha algum futuro, partindo agora de uma casa muito mais abaixo do que aquela em que tu começaste?

Quando decides ter um filho é sinal que tens esperança no futuro, mas não contas que o futuro não depende só de ti. Ou não depende nada de ti. Não sabes que por mais que trabalhes, que lutes, que te esforces, que rebentes, há coisas que não dependem de ti como… os financeiros da empresa onde trabalhas terem feito as contas certas, o Estado para o qual descontas não ter investido mal os teus impostos, o tempo em que tu vives não ser demasiado rápido para que num ápice tudo mude para pior.

Por isso, quando há uma crise, não daquelas que te atiram ao chão, mas daquelas que te encostam à parede e te dizem “o caminho acaba aqui”, tu és capaz de fazer o impensável – aquilo que disseste não entender, antes de perderes a esperança. É assim que aumentam os casos de maus tratos a crianças, que fizeram notícia esta semana. Estamos a tratar mal as crianças, como não acontecia há mais de 20 anos, não porque nos tornámos animais de repente mas porque estamos sem esperança, porque estamos cheios de medo, porque a tristeza nos está a comer por dentro.

A crise não é a desculpa é a causa. Olhas para o teu filho e ficas sem saber para que é que o fizeste nascer, porque vai passar por tudo isto e pior. Tens menos paciência quando ele chora, porque precisas mesmo de dormir para conseguires trabalhar bem amanhã, porque sabes que se trabalhares mal começas a ir para a lista dos próximos a despedir. Deixa-lo em frente à televisão horas a fio, para poderes limpar a casa e cozinhar de forma a transformar a pouca comida que tens numa refeição e para poderes trabalhar mais um bocado. Às vezes não chegas a tempo de o ir buscar à escola e ele vem para casa sozinho. Às vezes levantas-te demasiado cedo para o acordares e sais de casa em direção ao autocarro a desejar que ele oiça o despertador e que coma o bolicao que deixaste na bancada e que não seja raptado no caminho para a escola, nem violado pelo vizinho sinistro do quinto andar. E tens a certeza absoluta que o podias educar melhor se tivesses mais tempo e tens a certeza absoluta que podias trabalhar mais e melhor se não tivesses um filho. E desesperas e… ou te cortas, ou te bates, ou começas a tratar mal a quem mais queres. A tristeza começa a tornar-te um monstro, tu sabes e não te controlas porque já não és capaz.

A crise, dra. Dulce Rocha, não é a desculpa é a culpada, porque a crise fez desaparecer as condições mínimas de muitas de nós sermos as mães que queríamos ser, levou-nos a certeza do pão na mesa todos os dias, levou-nos a certeza de que, aconteça o que acontecer, os nossos filhos vão estar sempre protegidos da fome e da pobreza que alguns dos nossos pais sofreram em crianças.

Quando dizes que é preciso ter valores que se sobreponham eu gostava imenso de concordar contigo, mas não conheço nenhum valor que se sobreponha à necessidade de comer. Enquanto tu e outras pessoas com responsabilidades e contactos políticos vão dizendo que a culpa é exclusiva de cada pai e mãe que maltrata um filho, que a crise é só uma desculpa, cada pai, cada mãe e cada filho vai ficando mais sozinho numa vida horrível que lhe foi imposta. A crise é cada vez mais uma coisa lá longe que nada tem a ver com a vida das pessoas e aposto que esta ideia descansa muito a consciência de quem tem responsabilidades de tomar decisões que afetam todos. Para ti é “só” estar desempregado, para os que só tinham o trabalho como fonte de alimento é a vida inteira e a dos filhos que está no limbo.

Então, a minha proposta, dra. Dulce Rocha, é que uses a tua influência para personificar a crise junto de quem decide, de forma a que menos famílias sejam afetadas pela crise ou que, sendo isto impossível, que as famílias tenham sempre como garante condições básicas para criar os filhos, de forma a não desesperarem. Pode ser? Obrigada!


quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Traí-te

Querido blogue,

fui escrever para outro lado e, ainda por cima, fui escrever sobre o amor, coisa que nunca faço aqui. Mas prometo-te um texto lindo, lindo, sobre a escola, fresquinho e emocionante, para a próxima semana.
A Farmácia de Serviço

terça-feira, 30 de julho de 2013

Pedido de ajuda: ALGUÉM QUE NÃO TENHA VACINADO OS FILHOS

Pedido de ajuda: ALGUÉM QUE NÃO TENHA VACINADO OS FILHOS PODE DAR-ME UMA ENTREVISTA SOBRE O ASSUNTO? 

Podem escrever para os comentários que eu posso não publicar. Podem também escrever para o e-mail ali ao lado!

Obrigada!

sexta-feira, 19 de julho de 2013

E agora que as águas estão cheias de piolhos...

(ainda me hão de explicar porque é que isto me acontece num ano sem férias)

...vamos refrescar-nos para aqui:


fotografia de João Guerreiro
 
Não há luzes ao fundo do túnel mas a arquitetura é espetacular e as vistas brutais.
 


fotografia de João Guerreiro


É a sugestão para o fim-de-semana! Ide ao Aqueduto das Águas Livres!

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Factos sobre a vida para a Margarida e a Melanie

Facto 1: As coisas más acontecem todas ao mesmo tempo, se tiverem dúvidas eu conto-vos o início de 2013 em que atrás de uma má notícia, vinha outra e mais outra.
Facto 2: Depois da tempestade vem mesmo a bonança, que é um tempo calmo, mas de ansiedade, em que cada toque de telefone ainda nos faz saltar da cadeira porque achamos ainda que é mais uma notícia terrível que nos vão contar.
Facto 3: Depois da bonança chegam as coisas boas em catadupa e só falta acreditarmos que vai ser sempre assim para ficarmos felizes.

Nota para o futuro: é preciso chorar muito para ficar bem.

Agradecimentos: aos dois bebés novos da família, aos empregos e às possibilidades novas, aos que nunca nos deixam cair mesmo quando temos vontade de nos deixarmos ir abaixo.

quinta-feira, 11 de julho de 2013

Olha! Olha! Aqui estou eu num blogue de qualidade!

É para ler este texto da 3 picuinhas sobre a educação laica que os Estado deveria oferecer aos nossos filhos, coisa que está constantemente a ser desrespeitada. Podemos incluir esta questão na discussão sobre que escola queremos?

quarta-feira, 10 de julho de 2013

Gostar das férias e do que se tem


A gente cresce, tem filhos e dá por nós a fazer o impensável e, ainda por cima, a gostar. Na última semana de Junho marcámos férias e fomos logo passar uma semaninha ao Algarve. A promoção de última hora mais barata que encontrámos (que agora andamos assim) levou-nos para um apartamento na Praia da Rocha e confesso que quando lá cheguei dei por mim a pensar que tinha ido parar a Benidorm . “Prédios, prédios, prédios, oh meu deus e eu que gosto tanto de Tavira, de Sagres, minha rica Praia do Amado, não podemos pelo menos ir aqui ao lado para o Alvor?” – esta era a Carla de antigamente a falar lá do fundo da memória. A Carla mais presente disse qualquer coisa como: “Minha querida, bem-vinda a tua vida real.”
Uma pessoa tem de gostar daquilo que tem, verdade? Mas esse nem foi o caso. A casa que nos calhou na rifa era ótima e eu, da varanda, via a praia, a serra de Monchique e o Rio Arade, coisas que me inspiravam na hora de acabar os últimos trabalhos (ser freelancer tem destas coisas) enquanto as crianças e o pai atravessavam a estrada e punham os pés na areia. Pôr os pés no mar é que demorava um bocadinho mais que o areal da Praia da Rocha nunca mais acaba. Entregue cada trabalho lá ia eu mergulhar no mar, numa espécie de recompensa que me dava a mim mesma. Foi tão bom que dei por mim a pensar “Se algum dia mudarmos de casa, vamos para um sítio em frente ao mar, nem que seja Benidorm.” Esta era a Carla de um futuro muito hipotético, mas a Carla mais presente não disse nada. Será que concordou com o plano?

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Portugal vs Austrália. Não, não estou a falar de futebol

Cabe hoje dizer que este blogue tem o nome que tem, na verdade verdadinha, porque Vou ter um bebé na Nova Zelândia soava a coisa geograficamente mais séria. A preguiça fez-me chamar-lhe na Austrália (ou foi o sentido prático?). Em todo o caso, a ideia era expressar que este Portugal é um país ao contrário e que dá vontade de ir para o mais longe possível. Como na Lua ou em Marte ainda não dá para criar criancinhas, teria de me contentar com os antípodas...

A minha 500ª amiga do facebook enviou-me um comparativo entre Portugal e Austrália há pouco tempo. E olha, dá que pensar MJC! Vamos?

If Australia were your home instead of Portugal you would...

use 2.3 times more electricity
make 77.98% more money
consume 63.14% more oil
have 38.04% more chance at being employed
Australia has an unemployment rate of 5.70% while Portugal has 9.20%
This entry contains the percent of the labor force that is without jobs.
Source: CIA World Factbook
have 22.43% more babies
spend 41.84% more money on health care
experience 20.78% less of a class divide
live 3.34 years longer
be 60% less likely to have HIV/AIDS

Para saber mais sobre a Austrália ou outros países, comparando com o nosso, podem ir a If it were my home.

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Sobre a escola, os exames, a greve, as whiskas e o umbigo

Em dia de greve de professores, ouvem-se as coisas mais extraordinárias e todas elas são, no fundo, no fundo, sobre o país.
1.       Há uma aluna a quem parece profundamente injusto não fazer o exame hoje, porque “há outros que estão a fazer.” Foi dito assim tal e qual, ao microfone da TSF. O problema da estudante não é ter-se preparado para um exame que não foi fazer, nem não ter dormido nada com os nervos da véspera de um exame tão importante agora adiado, não é prever o prolongamento dos prazos dos processos de entrada na faculdade e com isso ter que delongar decisões sobre o projecto de vida, nem sequer ter de alterar a data das férias. O problema está nos outros serem, na visão da rapariga, privilegiados. Se ela estivesse entre o “décimo” dos colegas que estava a fazer o exame mostrar-se-ia tão indignada?
2.       Os alunos de Braga revoltam-se contra os pares que, apesar da greve, conseguem fazer o exame, entrando nas salas onde decorre a prova porque se sentem injustiçados, segundo o relato da jornalista, tentando assim que a prova dos outros seja anulada. A sindicalista de Braga diz que os alunos invasores mostraram estar solidários com os professores em defesa da escola pública. Volto a fazer a mesma pergunta de outra maneira: então e os que estavam sentaditos a fazer o exame foram escolhidos entre os que não se identificam com a luta dos professores?
3.       O presidente da Confederação das Associações de Pais, Jorge Ascensão, explicou à TSF que a preocupação da Confap “centra-se nos jovens” e acrescentou “estamos dependentes do sentido de dever que os professores possam ter, o que, dado o número de docentes em causa, será difícil garantir que haja exames para todos os jovens». Sim, eu sei, está esquisito. Coisas da oralidade…
As declarações dos mais diversos quadrantes repetem-se e eu oiço em todas, como o gato branco e felpudo do anúncio da Whiskas, “blablabla, o meu umbigo. Blablabla, o meu umbigo. Blablabla, o meu umbigo.” Não há, nunca há, a vontade de pensar no outro a não ser como causa dos meus problemas. O outro nunca tem a possiblidade sequer de ter sorte, legitimidade ou razão. Sorte em ter sido chamado para fazer o exame (como no ponto 1), legitimidade para estar a fazer o exame dentro da sala, (como no ponto 2) ou razão para fazer greve (como no ponto 3). O outro, e de preferência o outro mais próximo de mim possível, é o culpado pela minha situação.
E se eu estivesse no lugar do outro, fazia exatamente o que ele faz: não querer saber de mim para nada, nem dos meus problemas. Fazia o exame, fazia a greve, protestava contra o exame, declarava-me contra a greve. Ou seja, a minha opinião depende exclusivamente da minha posição em relação aos outros. Se eu tiver o privilégio casual de fazer exame estou calada. Se eu ficar de fora dos chamados ao exame, então zango-me e grito e canto o Grândola… contra os meus iguais. Esta coisa da posição relativa face aos eventos determinar inteiramente as minhas ideias é tão criticada aos políticos e, afinal, o que fazem as pessoas comuns? Exatamente o mesmo e não é de agora, que o Gaibéus já conta esta história.
Enfim, não somos todos assim. Um participante no fórum da TSF lembra que "no Japão, o único grupo que não tem de se vergar perante o Imperador é o dos professores." É uma mensagem enorme que se envia às massas quando a figura maior de um país considera que aqueles que ensinam são os únicos que se lhe equiparam em valor. Um professor é igual a um imperador, diz o protocolo. Aqui, em Portugal, um professor não vale nada e é por isso que lhe batemos, cuspimos, não obedecemos, viramos as costas, etc.
Já sei, vêm aí os exemplos dos maus professores que tiveram, que não sabiam do que estavam a falar, que não se davam ao respeito, que não se davam ao trabalho de ensinar. Vá, vão contar as vossas histórias tenebrosas ali nos comentários, daquelas que mostram que os professores não merecem respeito nenhum.
Agora roubo de uma conversa de facebook uns comentários sobre os professores no Japão:
JPG: Mas o ensino no Japão é mesmo muito bom... e não há greves.
Carla Macedo: Vai na volta é bom porque o Estado japonês acredita que é mesmo importante dar boas condições de trabalho aos professores, assim como exigir destes excelentes capacidades humanas, teóricas e técnicas para ensinar.
JPG: ...além de que há também coisas 'esquisitas' como a ética profissional, o brio e a honra em fazer um trabalho bem feito de que possam ter orgulho, coisas que se calhar, quem invocou, no fórum da TSF, um direito sobre o poder divino do Imperador não se lembrou ou não se quis lembrar. Esse direito existe, sim senhor, mas porque os professores o fazem por merecer, trabalhando afincada e dedicadamente, aliás, como todos os trabalhadores japoneses. É giro que se falem em direitos dessa grandeza, mas se esqueça como são e porque são conquistados e mantidos.
Carla Macedo: Concordo contigo. Deixa-me acrescentar à lista: têm um processo de seleção muito exigente, muito difícil, ganham um salário muito confortável e têm estatuto de estrela da pop.
JPG: Sim, tudo certo, mas mesmo antes disso, já o Imperador lhes concedia o direito a não vergarem porque faziam um excelente trabalho...
 Carla Macedo: E por isso tinham melhores condições de vida do que a maioria.
Quando é que os melhores de um curso, de uma universidade, de um país, vão escolher dar aulas no ensino não universitário, quando a proposta do empregador é andar com a casa às costas 10 ou 20 anos? Se temos de ir para onde há trabalho (e eu concordo inteiramente com esta ideia) porque é que não podemos ficar onde há trabalho? Se eu entrar para os quadros de uma empresa, depois do devido período de experiência, fico na empresa até o posto de trabalho cessar. Se eu for professora concorro a um lugar e, apesar de 3 anos depois ainda haver necessidade de um professor da minha disciplina naquela escola, eu tenho que concorrer novamente para o território nacional inteiro e provavelmente não fico colocada na mesma escola. Onde é que está a lógica deste processo? Podia continuar a falar das condições de trabalho más, muito más, de muitos professores, mas depois ninguém lia este texto até ao fim.
Ninguém que queira enriquecer vai para professor, mas há mínimos que são aceitáveis pelos muito bons. Não percebo porque é que aqueles que ensinam os nossos filhos e lhes abrem os horizontes, lhes oferecem inúmeras possibilidades de vida e tanta inspiração não são os melhor tratados pela nossa sociedade. Não percebo. A consequência é que o sistema de ensino afasta à partida ou esgota gradualmente os melhores professores em potência.
A luta dos professores, dos alunos e dos pais devia ser conjunta pela reformulação do sistema de ensino, partindo de:
-          exigência muito alta nos critérios para aceder à docência;
-          boas condições de trabalho e respeito (sim, uma vénia dos decisores políticos ficava bem) para os professores.
 
Mas isto dava muito trabalho. Os pais e os alunos a colocarem-se no lugar dos professores, os professores a darem lugar aos melhores, etc, etc, dava muito trabalho. E, como diz o meu amigo de facebook:
JPG: Pois, é uma questão de prioridades na construção de um país. Uns preferem a educação, a saúde, o desenvolvimento, outros preferem construção anárquica, crédito desenfreado, estádios de futebol, auto-estradas à doida, aceitar subsídios para não produzir e etc. e tal...

sexta-feira, 17 de maio de 2013

Eu sou contra a adoção

Eu sou contra a adoção. Sou contra qualquer tipo de adoção. Sou contra os pais morrerem enquanto as crianças são pequenas. Na verdade sou contra os pais morrerem e ponto final. Sou contra as famílias de acolhimento. Sou contra as instituições de acolhimento de crianças. Sou contra a retirada das crianças da família biológica. Até sou contra as crianças sem pais, seja por morte ou abandono.
No meu mundo ideal nada disto existe porque todas as crianças que vivem são amadas, estimadas e cuidadas pelos pais. No meu mundo ideal, nem há crianças órfãs porque quando os pais morrem, aqueles que têm mesmo de morrer, há tios, primos e amigos que cuidam dos filhos que sobrevivem como se fossem seus filhos.
O problema é que o meu mundo ideal não existe. No meu mundo real, nestes últimos dias até aqui na sala ao lado, há mulheres que levam pancada do marido que bate também nos filhos, há miúdos que saltam de casa em casa entre a mãe que os abandonou, o pai que os maltratou e a família de acolhimento mal escolhida que não os deixa ir à escola. No meu mundo há famílias separadas pela pobreza, há crianças abandonadas em lares porque têm deficiências.
No meu mundo, há uns 15 anos atrás, vi chegar a um lar de crianças em risco uma menina de 10 meses com uma cabeça do dobro do tamanho normal, dos maus tratos que tinha recebido pela família biológica. Vi a cabeça a diminuir até ao tamanho normal. Vi-a chorar cada vez que saía de um colo. E foi assim até ao dia em que se iniciou o processo de adoção. Quando uma mulher solteira começou a visitá-la, a levá-la a passear, a dar-lhe colo só a ela, a levá-la para casa, vimos a Catarina pequenina a crescer, a melhorar dos problemas gástricos, a começar a sorrir e a ficar sozinha no chão bem-disposta. Estava a decorrer à frente dos meus olhos a transformação que o amor exclusivo significa na vida das crianças: melhoria da saúde, melhoria do desenvolvimento, melhoria enorme da felicidade.
Eu não sei o que fazia a mãe da Catarina na sua vida sexual. Nem me interessa. Tenho a certeza do que vou dizer, tanto que não me importo de ser dogmática: para a criança não faz uma diferença profunda se um pai, uma mãe, dois pais ou duas mães são homossexuais ou heterossexuais. O que faz diferença é se há um amor individual e bom para cada criança. A sociedade e as criancinhas da escola até podem gozar com a história e a família de cada um. Não faz diferença se no final do dia cada criança tiver quem a abrace e lhe dê beijinhos, se tiver quem a queira, quem lhe dê segurança. É só isto que tem de contar nos processos adoção. Hoje demos um belo passo neste sentido. Viva a Assembleia da República! Espero que mais passos sejam dados em breve!

terça-feira, 14 de maio de 2013

Mãe também lê

O Pombo Inglês é daqueles livros estranhos que me faz quase desistir para no último capítulo que me proponho a ler acontecer qualquer coisa, uma pequena coisa, que me faz aguentar mais um bocado. Aguentar, sim, é o termo, que a vida do rapaz personagem principal é dura, a linguagem é feia, a mãe é uma imigrante desgraçada, a tia queima os dedos para não ter impressões digitais, há um puto morto... enfim, não é bonito assistir.
Apesar de tudo, Harrison, a personagem principal, consegue encontrar sinais mágicos, de graça, de beleza na realidade da narrativa. E eu, e suponho que o leitor comum também, sorrio e é por isto, também, que continuo a ler.

O Pombo Inglês é o primeiro livro do Stephen Kelman e foi editado cá na terra pela Teorema.

quarta-feira, 8 de maio de 2013

Portugal entre os melhores para ser mãe. Será?

Portugal entre os melhores países do mundo para se ser mãe. Este é o título da notícia publicada ontem no Público a propósito do relatório da Save the Children, que coloca Portugal na 13ª posição, de um conjunto de 176 países.
O relatório chama-se "Sobreviver ao primeiro dia - o estado das mães no mundo em 2013." O relatório está disponível on-line e ao lê-lo dá para perceber que os critérios valorizados são as condições de nascimento, o apoio às mães, os cuidados de saúde materna e infantil. Não tenhamos dúvidas: Portugal fez um caminho extraordinário e hoje a mortalidade infantil é muito reduzida, as mortes por complicações no pós-parto são praticamente inexistentes. O sistema de saúde nacional funciona bastante bem para mulheres e crianças. Tudo isto é maravilhoso. Mas é muito diferente de Portugal ser o 13º melhor país para ser mãe.
O envolvimento das mulheres em Portugal no mercado de trabalho é, segundo o Eurostat, superior à média europeia e isto, digo eu, está mais relacionado com os salários baixos do que com a vontade de não nos dedicarmos à família. A remuneração das mulheres em Portugal é em média inferior à dos homens que ocupam funções semelhantes. A rede pré-escolar não cobre todas as necessidades (e falarei disto, na primeira pessoa, muito em breve), sendo inexistente antes dos 3 anos. Ah, há também os preconceitos que dificultam a empregabilidade das mães e aquela coisa estranhíssima de uma pessoa querer cumprir o horário de trabalho para ir buscar os filhos à escola que está quase a fechar.
Ser mãe é mais que parir. Felizmente que em Portugal podemos dar à luz em excelentes condições. Mas falta o que se segue.

terça-feira, 7 de maio de 2013

Exames de fim de ciclo

Os exames do 4.º ano são um problema? Ou são vários problemas? Desculpem, ouvi o senhor de uma associação de pais a dizer que nem na faculdade se fazem provas com 2 horas e 40 minutos e só me apetece perguntar em que faculdade é que ele andou.
Há mais questões, não é? A criança ficar marcada por uma nota má... A pressão que a criança sofre sem necessidade... A possibilidade de a criança por causa dos nervos não conseguir ter um bom desempenho... Pois, não percebo.

Bom, se alguém me souber explicar como é que os exames da 4ª classe prejudicam as criancinhas agradeço que me deixem aqui nos comentários a explicação. É que eu não entendo.

terça-feira, 30 de abril de 2013

Cuidar dos cuidadores

Uma criança com necessidades especiais faz dos pais pais com necessidades especiais. É mais difícil descansar, é mais difícil não estar sempre preocupado, é mais difícil socializar, é mais difícil ir de férias. Em Alfândega da Fé existe um projeto inovador que inclui os pais nas equipas terapêuticas durante todo o ano e que nas férias permite aos cuidadores (sócios e não sócios de todo o país) cuidarem de si descansados. A Leque organiza Colónias de Férias para crianças que incluem acompanhamento por uma equipa multidisciplinar especializada e:
 
  • Estadia (dormida 7 noites);
  • Alimentação (pensão completa);
  • Reabilitação Psicomotora (Fisioterapia e Osteopatia);
  • Musicoterapia;
  • Balneoterapia (Hotel SPA);
  • Terapia de Relaxamento;
  • Terapia Assistida com Animais (São Bernardo, Burros e Pónei);
  • Psicologia e orientação;
  • Atividades lúdicas;
  • Atividades desportivas (BTT; Canoagem; Aeróbica; ...);
  • Atividades sociais e recreativas (Cinema; Teatro; Passeios; Piqueniques, ...).
Tem bom ar, não tem? Eu gosto particularmente da balneoterapia.
 
Os pais podem escolher ir de férias para muito longe se assim entenderem, ficar em casa a descansar descansados, ou... aproveitar o desconto de 20% e ficar alojados no Hotel SPA de Alfândega da Fé, usufruir de paisagens lindas de morrer, comer do bom e do melhor que a terra dá e passear pelas vilas com castelos, pelas aldeias de granito e pelas serras onde se perde a vista, desde a Estrela até Sanábria.

A curiosidade sobre este projeto mata-se na Leque. Giro, não é?

sexta-feira, 26 de abril de 2013

O que andamos a ler

Este livro está tão bem feito que até se sente o cheiro dos espinafres. Fartamo-nos de rir com a pergunta "Quem é o Chico?" e as respostas da Rita. A Marta Torrão, que o escreveu e desenhou, deve saber bem o que é não gostar de sopa. Come a sopa, Marta! foi editado há anos pela Bichinho de Conto e é o que temos servido por estes dias à sobremesa.

Do 25 de Abril há muitas versões

Um episódio recente tem sempre milhares de versões, dependendo do lado em que se esteve. O 25 de Abril não é, felizmente, uma só coisa, um só sentimento, uma só lembrança. Para a vida das pessoas normais, aquelas que não tinham gente de família na prisão, nem gente em cargos de poder, o 25 de Abril significou: salário mínimo, divórcio por iniciativa da mulher, equiparação dos membros do casal dentro do casamento, possibilidade de escolhas de emancipação, acesso a cuidados de saúde a baixo custo, fim da guerra colonial.
Nos dias que precederam ontem tive muitas dúvidas sobre celebrar esta festa, porque a política que nos mexe na vida todos os dias parece mostrar-nos que afinal não valeu a pena. Depois lembrei-me da avó que cuidou do avô durante sete anos antes que ele morresse apenas com as suas poupanças, lembrei-me do tio que voltou da guerra e nunca mais dormiu descansado, da tia que se separou do marido depois de anos de maus tratos, do primo que foi reconhecido pelo pai em vez de ser filho de pai incógnito...
Sim, estamos mais pobres, temos mais medo, mas já não aceitamos um série de coisas,porque Abril nos trouxe outra visão. E isso, não mudará tão cedo. Porque estas coisas da vida terrena já nos entraram dentro do peito.



foto de http://3picuinhas.blogspot.pt/

quarta-feira, 24 de abril de 2013

Vamos pagar o ATL! Viva!

Querido Ministro Nuno Crato,

colocar do lado dos pais o pagamento de parte do valor das atividades de enriquecimento curricular no primeiro ciclo da escola pública, aquilo que os humanos chamam ATL, vai no sentido inverso aos discursos da produtividade que o seu governo tem tido.

É simples: Onde estão os empregos que terminam às 14h00 para que possamos estar às 15h00 nas escolas para ir buscar os miúdos? Como é que um trabalhador independente ou um tarefeiro diz "venho, sim, trabalhar para este projeto de um mês mas só metade do dia"? E ainda, onde estão os empregos ou trabalhos em que se recebe valor suficiente para pagar esta despesa? Em lado nenhum, certo?

O maior problema, para variar, não é para os pobres, nem para os ricos. É para a classe média empobrecida que passa, também, a ponderar se vale mais trabalhar ou ficar em casa.

Já me estou a ver enriquecer o currículo do meu filho com inglês em frente à televisão tardes inteiras enquanto eu termino mais uma tradução, o arranjo de uma cadeira ou a bainha de uma saia!

sexta-feira, 1 de março de 2013

Os meus dois ou três maridos

O meu primeiro ex-marido trabalhava pouco, ganhava muito menos do que eu, ainda assim tinha uma vida tranquila. A conta no banco era comum e ele podia gastar o que quisesse. Eu ganhava bem e podia pagar-lhe os luxos. Não me importava. Gostava de o ver bem vestido, com belas camisas e sapatos estrangeiros, a falar muito mais do que eu com os meus amigos alemães, espanhóis, ingleses e franceses, mesmo se o nível de inglês não lhe permitisse ter conversas elaboradas (das outras línguas nem vos conto) a sua expressividade era notável. Ficava sempre bem.
Comecei a cansar-me do meu primeiro ex-marido ao mesmo tempo que comecei a ganhar menos bem. Ele exigia-me o mesmo tipo de vida luxuosa e eu, sem lha poder dar, comecei a pensar se não estaria na altura de lhe cortar alguns privilégios. Ele dizia-me que não, que tinha um estilo de vida a manter, mas que eu podia deixar algumas das coisas que eu pagava com o meu dinheiro: primeiro as roupas de marca e os jantares em restaurantes, depois as jantaradas em casa com os amigos, depois o carro, depois a casa… Ou então que fizesse um crédito.
Foi quando troquei a casa que alugava por uma menor, que troquei de marido. Já não gostava do primeiro há algum tempo e lembro-me perfeitamente de ver o meu segundo a avançar pela multidão e destacar-se muito. Era tão diferente do primeiro: era alto como um príncipe, loiro, falava muito bem inglês, não se mostrava vaidoso, usava óculos para ler. Mas era como falava português que me encantava: dizia umas coisas de arrepiar sobre a justiça e a igualdade e o viver com menos. Era um asceta. Fomos logo viver juntos. Não vale a pena esperar quando se reconhece o amor da vida, verdade?
Os primeiros tempos foram maravilhosos. Muita partilha de sacrifícios, muito conforto quando eu chegava a casa depois de horas de cansaço, muito boa conversa. Aos poucos comecei a reparar que era sempre eu quem chegava a casa mais tarde, aos poucos comecei a notar que ele nunca estava cansado, que ele não colocava dinheiro nenhum na conta partilhada, mas que cada vez eu tinha menos dinheiro para as minhas coisas. Ele dava-me bons conselhos e dizia-me para andar a pé e comer de marmita no trabalho. Dizia-me para não comprar roupa, nem sequer na feira do relógio. Ele engordava e estava cada vez mais bonito. Continuava um príncipe, cada vez com um ar mais sério, quase, quase a tornar-se um rei.
Quando a minha conta chegou quase aos zeros quis pô-lo fora de casa mas era tarde demais. Estava tão bem instalado, era tão amigo dos vizinhos, que quem teve de sair fui eu. Ando agora à procura de casa e sem rendimentos razoáveis que possa apresentar para um contrato de aluguer, viverei num quarto de uma pensão enquanto tiver dinheiro. Dizem-me que o meu segundo ex-marido vive bem, na casa que foi minha, à custa dos vizinhos e que faz jantares animados aos quais vai também o meu primeiro marido. Disseram-me que se divertem muito e que falam de mim.
Eu, como não sei viver sem marido, ando à procura do terceiro. Só espero ter sorte e encontrar um muito bonzinho, que não me engane, nem me roube… e que seja bonito.

Maria da República Portuguesa Santos Oliveira Silva


sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Alimentação: educar para viver melhor

O peso a mais e a obesidade combatem-se desde a mais tenra idade. É urgente educar as crianças para os sabores saudáveis.
Educar para viver

O Henrique tem 11 meses e já ninguém duvida da sua vontade de crescer: pesa 12 quilos, mede quase 80 centímetros e só cabe em roupas de 2 anos. É mais ou menos do mesmo tamanho que o primo, com mais um ano, e quem os vir sentados não acredita que a diferença de idades seja tão grande.
“O Henrique não foi sempre assim”, diz a mãe, Sofia Alves, professora. “Nasceu pequenino, com 2,100 kg. A tabela de percentil nem sequer considerava o peso dele. O ser tão pequeno chocou-me muito. Comecei a dar-lhe o biberão ao mínimo choro e ele cresceu a olhos vistos. Agora o pediatra fala em fazer dieta, mas custa-me dar-lhe menos comida. Racionalmente, percebo o que se passa, mas continuo a ter muito medo que volte a ficar pequenino.”
 
O Henrique pode ser mais um caso de estudo para a teoria da reprogramação, segundo a qual as hormonas do crescimento e o metabolismo sofrem alterações para se adaptarem ao meio numa fase precoce do desenvolvimento, como a vida in utero ou a infância, alterações essas que ficam inscritas no corpo para sempre. Segundo esta teoria, os recém-nascidos de baixo peso (menos de 2500 gramas) têm tendência a ser obesos, porque a falta de nutrientes disponíveis durante a gravidez leva a que o feto diminua as suas necessidades de alimento para se desenvolver (Sofia Alves conta que fez uma dieta rigorosa, não definida pelo médico, porque “não queria engordar” e acabou por quase não ganhar peso). Quando o bebé, que estava habituado a poupar energia e por isso nasce pequenino, é exposto a um ambiente externo de abundância, acaba por comer muito mais do que necessita e torna-se rapidamente um bebé obeso.
Há muitos mais fatores que levam à obesidade infantil: nascer com peso superior a 3,500 kg, andar sempre de carro, brincar só em casa, ver muita televisão e as condicionantes de herança genética. Mas estas parecem ser as variáveis, o denominador comum, sempre que se fala de excesso de peso, é a falta de qualidade da alimentação. Um exemplo absurdo serve para mostrar esta evidência: ninguém engorda, por mais sedentário que seja, se comer sempre e só alface. Em linguagem académica, podemos dizer que o excesso de peso começa quando a ingestão de calorias ultrapassa regularmente o consumo energético.
Certo é que há cada vez mais gordos entre nós e cada vez mais crianças com peso a mais. A obesidade infantil já é considerada uma epidemia mundial por afetar tantos milhões de crianças e a diretora-geral da Organização Mundial de Saúde, Margaret Chan, referiu-se a esta geração como “a primeira que vai viver mais doente e menos tempo do que os seus pais”.
Segundo vários estudos citados por Sandrina Gaspar Carvalho, no seu artigo Obesidade infantil, a epidemia do século XXI – revisão da literatura sobre estratégias de prevenção, 2009 –, a persistência da obesidade “no início da idade adulta poderá diminuir a esperança de vida de cinco a vinte anos”, em consequência de todas as doenças associadas ao peso excessivo, como a diabetes ou as doenças cardiovasculares. E o grave é que “60% das crianças obesas permanecem adultos obesos”.
É preciso atuar agora. Ensinar a comer. Em fevereiro de 2010, Jamie Oliver denunciou a situação da má nutrição das crianças americanas e inglesas, na conferência dos TED Awards (conjunto global de conferências onde pessoas destacáveis em várias áreas partilham as suas ideias e experiências), na Califórnia. O cozinheiro mais popular da Grã-Bretanha aponta como problemas graves a incapacidade de comer corretamente e a dificuldade em cozinhar de forma apropriada. Fala do conceito de “paisagem alimentar” para explicar que a herança que as últimas quatro gerações têm passado às suas crianças não inclui alimentação saudável nem ensinamentos de cozinha. A solução passa por todos, incluindo as grandes marcas alimentares: a educação alimentar tem de ser uma prioridade. E, na escola, há duas coisas a fazer: oferecer refeições equilibradas todos os dias e fazer com que os jovens terminem a escolaridade sabendo cozinhar “dez receitas que lhes vão salvar a vida”.
Alguns estudos recentes na área do comportamento alimentar parecem corroborar esta ideia de “paisagem alimentar” como uma influência decisiva nas escolhas alimentares das crianças. A pressão do meio ambiente é decisiva para a população em geral (e por isso Jamie Oliver fala das grandes cadeias alimentares) como as disponibilidades no frigorífico ou na despensa de casa são fundamentais para cada criança, cada pessoa.
O Journal of Nutrition Education and Behavior publicou já este ano os resultados de um estudo sobre a exposição das crianças a alimentos saudáveis, nomeadamente aos vegetais, que referem que as que estão habituadas a ver diariamente no prato legumes e saladas consomem-nos com mais facilidade do que aquelas que desconhecem ou têm pouco contacto com essa classe de alimentos.
Os chefes da cozinha de pesquisa vêm falando disto há anos, embora a preocupação esteja mais ligada às questões da memória gustativa do que às nutritivas. Mas quando andam à procura dos sabores de antigamente, demonstram um saber empírico sobre a importância da infância na fixação dos nossos gostos alimentares. Se desde pequenas as crianças forem habituadas a comer maus alimentos, a probabilidade de eles serem a parte fundamental da dieta de adulto é muito grande. Se lhes for sempre oferecida sopa, fruta, salada e pratos confecionados com rigor nutritivo vão ser esses os componentes da sua alimentação no futuro. Ao darmos uma dieta saudável aos nossos filhos, estamos a favorecer-lhes a saúde e a oferecer-lhes mais anos de vida.

O QUE DIZEM OS NÚMEROS
.
O excesso de peso em larga escala começou a ser detetado há 30 anos.
. No mundo, há hoje 42 milhões de crianças com menos de 5 anos com peso a mais.
. 35 milhões dessas crianças gordas vivem em países em desenvolvimento.
. Portugal está entre os países europeus com maior número de crianças com excesso de peso.
. Mais de 30% das crianças entre os 7 e 9 anos tem excesso de peso ou é obesa, segundo um artigo do Serviço de Pediatria do Hospital do Espírito Santo, de Évora.
. Entre os 10 e os 18 anos, a percentagem é de 31%, de acordo com o livro da dietista Joana Sousa, Obesidade Infanto-juvenil em Portugal.


Saiba mais na Máxima.

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Não somos filhos de deus

As respostas de um pai ateuOnde está Deus, papá? é um ensaio sobre a educação não-religiosa que se pode dar às crianças para que se tornem adultos tolerantes e bem-formados. Se ateus ou crentes, eles decidirão quando possam.


Clemente Gª Novella tem 42 anos e acaba de escrever e publicar um livro no mínimo raro. Onde está Deus, papá? – Asrespostas de um pai ateu está envolto em polémica em Espanha, país que, como o nosso, regista uma larga maioria da população como católica. Essa população não sendo praticante de todos os ritos de fé socorre-se dos preceitos religiosos para explicar conceitos como o bem, o mal ou a própria existência e isto acontece tanto na esfera pública como na privada. Mas será que é mesmo necessário pensar num deus para agir corretamente? Ou para percebermos por que razão estamos aqui? Estas são duas das questões que o livro ajuda a clarificar.

Quando escrevo a Clemente, numa sexta-feira depois do almoço, para fazer a entrevista, diz-me com simplicidade que há de responder-me mais tarde porque de momento está a ajudar os seus filhos com os trabalhos de casa. Os rapazes têm 9 e 10 anos e foram eles a inspiração para este livro. No prólogo que Clemente assina, explica que os seus meninos eram muito pequenos quando “me perguntaram pela primeira vez se Deus existia; uma dúvida que eu nunca tive em criança. (…) Claro que acreditava num deus.” É neste quadro de simplicidade, de empenho na educação dos filhos e de pôr em perspetiva os dois lados de cada questão que todo o livro de desenvolve e é, por isso mesmo, que ele é raro: por não ser pretensioso, nem esperar que o leitor já tenha feito todas as leituras ou pensado nestas questões muito a sério. Também é raro e original porque não tenta impingir uma perspetiva radical do mundo a quem o lê. É só o discurso de um homem a sistematizar as suas ideias e o caminho que o levou ao ateísmo.

“É um processo gradual,” diz-me o autor. “Primeiro vamo-nos dando conta, facilmente, de que os deuses de outras épocas ou de outros lugares são simples mitos, são lendas. Depois, sem refletir muito, vamo-nos apercebendo que o deus na nossa infância também é um ser mitológico.” Os sete primeiros capítulos do Onde está Deus papá? ocupam-se da demonstração que a invenção dos deuses serviu um propósito de explicação do mundo quando a ciência ainda nem germinava, tal como se faz num curso breve de filosofia. Mas se é tão evidente, não seria de esperar que mais pessoas se tornassem ateias? “Creio que no fundo foi essa dúvida que me motivou a escrever o livro. Perguntava a mim próprio: É tão evidente para mim que os deuses são fruto da imaginação humana… Como pode ser que uma espantosa maioria de pessoas em todo o mundo continue a acreditar neles?”

A partir desta questão, das colocadas pelos filhos e das que antecipa que venham no futuro a ser feitas, Clemente, enquadra os valores morais como uma necessidade de convivência em sociedade. No fundo basta pensar em duas regras básicas para conseguir agir corretamente: não faças aos outros o que não queres que te façam a ti e fazer aos outros apenas aquilo que eles te tenham dito que desejam. A vantagem destes princípios, lê-se no livro, é que as crianças os entendem e podem facilmente praticar.

Como esta resposta, todas as demais são simples. São ao todo 24 e são formuladas para ajudar quem quer criar os seus filhos sem o auxílio da religião, seja ela qual for. No entanto, o livro nunca predica contra as crenças dos outros. Afirma antes a possibilidade de educar segundo parâmetros exclusivamente humanos e prevê até a eventualidade das crianças criadas num ambiente sem deus se tornarem religiosas, afirmação verdadeiramente estranha para um ateu. Clemente Gª Novella é, mais do que tudo, antidogma: “Se os meus filhos vão ser ateus toda a vida? Suponho que sim. O normal é que os meus filhos sejam ateus. Mas se um dia sentirem necessidade de recorrer ao consolo metafísico que oferecem as religiões (…) se isso os fizer mais felizes, eu não terei nenhuma objeção.”

Onde está Deus, papá?
Clemente G. Novella

Preço: 14,50 €
Editora Verso de Kapa

quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Educar sem Deus


Está nas bancas a revista Máxima de Janeiro, com um artigo sobre as possibilidades de educar uma criança em Portugal, sem recorrer a conceitos religiosos. Não são muitas, é certo, já que a nossa mentalidade colectiva tem muita tradição católica, mas não deixa de ser surpreendente que alguns dos pais entrevistados que se afirmam como crentes optem por educar os seus filhos com exemplos de bom senso e não com dogmas religiosos.
Este artigo parte de uma leitura do livro Onde está Deus Papá, editado em português pela Verso de Kapa, e da entrevista ao seu autor, Clemente Gª Novella, que reproduzo no próximo texto.