Comecei a cansar-me do meu primeiro ex-marido ao mesmo tempo que comecei a ganhar menos bem. Ele exigia-me o mesmo tipo de vida luxuosa e eu, sem lha poder dar, comecei a pensar se não estaria na altura de lhe cortar alguns privilégios. Ele dizia-me que não, que tinha um estilo de vida a manter, mas que eu podia deixar algumas das coisas que eu pagava com o meu dinheiro: primeiro as roupas de marca e os jantares em restaurantes, depois as jantaradas em casa com os amigos, depois o carro, depois a casa… Ou então que fizesse um crédito.
Foi quando troquei a casa que alugava por uma menor, que troquei
de marido. Já não gostava do primeiro há algum tempo e lembro-me perfeitamente
de ver o meu segundo a avançar pela multidão e destacar-se muito. Era tão diferente
do primeiro: era alto como um príncipe, loiro, falava muito bem inglês, não se
mostrava vaidoso, usava óculos para ler. Mas era como falava português que me
encantava: dizia umas coisas de arrepiar sobre a justiça e a igualdade e o
viver com menos. Era um asceta. Fomos logo viver juntos. Não vale a pena
esperar quando se reconhece o amor da vida, verdade?
Os primeiros tempos foram maravilhosos. Muita partilha de
sacrifícios, muito conforto quando eu chegava a casa depois de horas de
cansaço, muito boa conversa. Aos poucos comecei a reparar que era sempre eu
quem chegava a casa mais tarde, aos poucos comecei a notar que ele nunca estava
cansado, que ele não colocava dinheiro nenhum na conta partilhada, mas que cada
vez eu tinha menos dinheiro para as minhas coisas. Ele dava-me bons conselhos e
dizia-me para andar a pé e comer de marmita no trabalho. Dizia-me para não
comprar roupa, nem sequer na feira do relógio. Ele engordava e estava cada vez
mais bonito. Continuava um príncipe, cada vez com um ar mais sério, quase,
quase a tornar-se um rei.
Quando a minha conta chegou quase aos zeros quis pô-lo
fora de casa mas era tarde demais. Estava tão bem instalado, era tão amigo dos
vizinhos, que quem teve de sair fui eu. Ando agora à procura de casa e sem rendimentos
razoáveis que possa apresentar para um contrato de aluguer, viverei num quarto
de uma pensão enquanto tiver dinheiro. Dizem-me que o meu segundo ex-marido
vive bem, na casa que foi minha, à custa dos vizinhos e que faz jantares
animados aos quais vai também o meu primeiro marido. Disseram-me que se
divertem muito e que falam de mim.
Eu, como não sei viver sem marido, ando à procura do
terceiro. Só espero ter sorte e encontrar um muito bonzinho, que não me engane,
nem me roube… e que seja bonito.
Maria da República Portuguesa Santos Oliveira Silva
1 comentário:
Que belo regresso à vida :)
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