sexta-feira, 27 de setembro de 2013

Reclamação construtiva

 
 
O meu filho X submeteu-se a vários exames auditivos no Hospital D. Estefânia, de acordo com prescrito anteriormente numa consulta de otorrinolaringologia, que duraram cerca de 10 minutos, depois de bastantes mais à espera de consulta, e com uma interrupção pelo meio. Tudo procedimentos normais dos quais não me queixo.
 
Queixo-me da sugestão para levar o X ao psicólogo feita pela técnica que estava a fazer os exames que, como referi acima, demoraram 10 minutos. A razão apontada: dificuldades de concentração.
 
O X tem 5 anos, é uma criança e não deveria ser preciso dizer mais nada. Mas eu digo: é uma criança normal, curiosa e que adorou o vosso laboratório de audiometria que tem auscultadores, luzes e maquinetas que ele nunca tinha visto!
 
Gostava de saber se parece razoável a alguém que uma técnica de audiometria possa fazer também uma avaliação psicológica e... em 10 minutos. Espero que quem receber esta reclamação perceba que não estou ofendida, na medida em que, felizmente, sei quem é o meu filho e confio plenamente nas avaliações que a escola que frequenta faz dele regularmente. Mas conheço alguns pais e profissionais de saúde para quem esta simples afirmação em contexto hospitalar iniciará facilmente um breve caminho até à hiperatividade, ao deficit de atenção e à medicação.
 
E é por isso que vos dou nota do acontecido. Esperando que sirva esta reclamação para que tal não ocorra novamente.
 

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Da escola: não querer ser professor

A minha licenciatura era vocacionada para o ensino - ensino de português língua materna com sua gramática e literatura para as criancinhas e adultos que frequentassem o ensino secundário em Portugal ou em português no estrangeiro. Era a saída mais evidente ou a entrada no mercado de trabalho mais direta do curso de Línguas e Literaturas Modernas, variante estudos portugueses.

No meu ano havia 4 bons alunos, daqueles que se destacavam mesmo pelas notas muito boas, pela noção de encantamento que nos devia causar a leitura de um poema e pela capacidade de pensar e relacionar as matérias do programa curricular com as demais matérias da vida.

Desses 4 alunos que se destacavam pela positiva num curso vocacionado para o ensino, hoje nenhum é professor do ensino secundário em Portugal. A Cláudia deixou os estudos literários a meio do curso para se dedicar ao Conservatório de Teatro e hoje escreve e dirige peças de teatro acutilantes e reconhecidas pela crítica. O Diogo seguiu para o Conservatório depois da licenciatura e do convite para integrar o mestrado em Linguística e, a última vez que o vi, era ator. O Pedro mestrou em literatura portuguesa, constituiu uma escola de artes e escreveu já vários livros, o último recentemente publicado, Despaís, é um livro do caraças, isto é, um livro que todos os portugueses e todos os cidadão de países em crise deviam ler.

Quanto a mim, escolhi não ser professora por duas razões: teria de estudar mais dois anos até poder exercer a profissão (um ano para pedagógicas com exigência de presença diária, coisa impossível para mim que já trabalhava, e um ano de estágio numa escola) e teria para sempre um mau patrão (lembro-me de ter dito isto tal e qual). Era o ano da graça de 2001.

Desde há 12 anos, eu tive dois contratos de trabalho sem termo, 2 anos de contrato com termo certo, com dois anos de desemprego interpolados por recibos verdes. Fui enganada algumas vezes, tive de andar a choramingar para conseguir cobrar muitas mais e a fazer trabalhos muito diferentes do que a minha ocupação principal faz prever. Tive meses em que não ganhei um tostão e outros em que ganhei tão mal que não chegou para as despesas.

Nunca me arrependi da decisão de não ser professora. Porque se fosse, tinha andado pelo país de mala às costas, ganhando uma ínfima parte do dinheiro que já ganhei até hoje, reduzida para sempre ao estatuto de aluno Erasmus cá dentro, dividindo casas com gente estranha, incapaz de construir uma família, ou vendo os filhos crescer aos fins-de-semana, continuando a ler apenas no comboio de regresso a casa, levando pancada da primeira mãe cujo filho eu repreendesse, sendo gozada por profissionais medianos de outras profissões que me diriam: ‘és professora porque não arranjaste mais nada para fazer?’ e não conseguindo nem uma vez uma contratação por mais do que um ano, não por fim da necessidade do meu trabalho, mas porque é assim o sistema, sendo alvo da chacota dos alunos que eu sentisse a necessidade de chumbar porque as passagens administrativas de multiplicaram ao extremo.

Eu acho estranho que um país não queira aproveitar para o ensino da sua língua materna, da sua cultura, os seus melhores alunos. Como nós os 4 deve haver mais mil que desistem de ensinar no liceu por motivos alheios à docência. Mas pelos vistos sou só eu que acha estúpidas a vida dos professores, as obrigações destes e a sua relação com a entidade patronal. Para o Ministério da Educação tudo vai bem e não é de agora.