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quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

Mensagem de Natal da Presidente do Blogue e O que andamos a ler

Tenho imensa vontade de falar sobre o paradoxo da classe que avalia não querer ser avaliada e da estranheza que me causa 13 mil pessoas aceitarem fazer um exame e depois serem os controladores dessa prova (e já detentores dessa profissão) a fazerem greve apesar de não se ter conseguido organizar um boicote.

Tenho imensa vontade de vos contar sobre um acidente de viação em que um carro está parado mas ainda assim o condutor do carro em movimento insiste não ter culpa de nada e partir deste fait-diver do quotidiano para um ensaio sobre a educação e o respeito que nos falta tanto a nós portugueses, quase todos, safados.

Mas não. Estamos no Natal e venho cá dizer-vos que 'O que andamos a ler' é 'A noite de Natal' de Sophia de Mello Breyner Andresen e mais uma vez confirmo que os pequenos são capazes de reconhecer a beleza da literatura, das suas camadas e das suas músicas de palavras, da forma mais simples, quando se emocionam com uma frase ou uma ideia.



Devo agradecer a escritores como estes, não só por nos contarem histórias belas, como por nos sustentarem a verticalidade da coluna quando às vezes, ou muitas vezes, temos vontade de tentar fazer como os outros. Mas nessa altura os nossos filhos não seriam os nossos filhos. Obrigada Sophia!

Feliz Natal.

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Sobre a escola, os exames, a greve, as whiskas e o umbigo

Em dia de greve de professores, ouvem-se as coisas mais extraordinárias e todas elas são, no fundo, no fundo, sobre o país.
1.       Há uma aluna a quem parece profundamente injusto não fazer o exame hoje, porque “há outros que estão a fazer.” Foi dito assim tal e qual, ao microfone da TSF. O problema da estudante não é ter-se preparado para um exame que não foi fazer, nem não ter dormido nada com os nervos da véspera de um exame tão importante agora adiado, não é prever o prolongamento dos prazos dos processos de entrada na faculdade e com isso ter que delongar decisões sobre o projecto de vida, nem sequer ter de alterar a data das férias. O problema está nos outros serem, na visão da rapariga, privilegiados. Se ela estivesse entre o “décimo” dos colegas que estava a fazer o exame mostrar-se-ia tão indignada?
2.       Os alunos de Braga revoltam-se contra os pares que, apesar da greve, conseguem fazer o exame, entrando nas salas onde decorre a prova porque se sentem injustiçados, segundo o relato da jornalista, tentando assim que a prova dos outros seja anulada. A sindicalista de Braga diz que os alunos invasores mostraram estar solidários com os professores em defesa da escola pública. Volto a fazer a mesma pergunta de outra maneira: então e os que estavam sentaditos a fazer o exame foram escolhidos entre os que não se identificam com a luta dos professores?
3.       O presidente da Confederação das Associações de Pais, Jorge Ascensão, explicou à TSF que a preocupação da Confap “centra-se nos jovens” e acrescentou “estamos dependentes do sentido de dever que os professores possam ter, o que, dado o número de docentes em causa, será difícil garantir que haja exames para todos os jovens». Sim, eu sei, está esquisito. Coisas da oralidade…
As declarações dos mais diversos quadrantes repetem-se e eu oiço em todas, como o gato branco e felpudo do anúncio da Whiskas, “blablabla, o meu umbigo. Blablabla, o meu umbigo. Blablabla, o meu umbigo.” Não há, nunca há, a vontade de pensar no outro a não ser como causa dos meus problemas. O outro nunca tem a possiblidade sequer de ter sorte, legitimidade ou razão. Sorte em ter sido chamado para fazer o exame (como no ponto 1), legitimidade para estar a fazer o exame dentro da sala, (como no ponto 2) ou razão para fazer greve (como no ponto 3). O outro, e de preferência o outro mais próximo de mim possível, é o culpado pela minha situação.
E se eu estivesse no lugar do outro, fazia exatamente o que ele faz: não querer saber de mim para nada, nem dos meus problemas. Fazia o exame, fazia a greve, protestava contra o exame, declarava-me contra a greve. Ou seja, a minha opinião depende exclusivamente da minha posição em relação aos outros. Se eu tiver o privilégio casual de fazer exame estou calada. Se eu ficar de fora dos chamados ao exame, então zango-me e grito e canto o Grândola… contra os meus iguais. Esta coisa da posição relativa face aos eventos determinar inteiramente as minhas ideias é tão criticada aos políticos e, afinal, o que fazem as pessoas comuns? Exatamente o mesmo e não é de agora, que o Gaibéus já conta esta história.
Enfim, não somos todos assim. Um participante no fórum da TSF lembra que "no Japão, o único grupo que não tem de se vergar perante o Imperador é o dos professores." É uma mensagem enorme que se envia às massas quando a figura maior de um país considera que aqueles que ensinam são os únicos que se lhe equiparam em valor. Um professor é igual a um imperador, diz o protocolo. Aqui, em Portugal, um professor não vale nada e é por isso que lhe batemos, cuspimos, não obedecemos, viramos as costas, etc.
Já sei, vêm aí os exemplos dos maus professores que tiveram, que não sabiam do que estavam a falar, que não se davam ao respeito, que não se davam ao trabalho de ensinar. Vá, vão contar as vossas histórias tenebrosas ali nos comentários, daquelas que mostram que os professores não merecem respeito nenhum.
Agora roubo de uma conversa de facebook uns comentários sobre os professores no Japão:
JPG: Mas o ensino no Japão é mesmo muito bom... e não há greves.
Carla Macedo: Vai na volta é bom porque o Estado japonês acredita que é mesmo importante dar boas condições de trabalho aos professores, assim como exigir destes excelentes capacidades humanas, teóricas e técnicas para ensinar.
JPG: ...além de que há também coisas 'esquisitas' como a ética profissional, o brio e a honra em fazer um trabalho bem feito de que possam ter orgulho, coisas que se calhar, quem invocou, no fórum da TSF, um direito sobre o poder divino do Imperador não se lembrou ou não se quis lembrar. Esse direito existe, sim senhor, mas porque os professores o fazem por merecer, trabalhando afincada e dedicadamente, aliás, como todos os trabalhadores japoneses. É giro que se falem em direitos dessa grandeza, mas se esqueça como são e porque são conquistados e mantidos.
Carla Macedo: Concordo contigo. Deixa-me acrescentar à lista: têm um processo de seleção muito exigente, muito difícil, ganham um salário muito confortável e têm estatuto de estrela da pop.
JPG: Sim, tudo certo, mas mesmo antes disso, já o Imperador lhes concedia o direito a não vergarem porque faziam um excelente trabalho...
 Carla Macedo: E por isso tinham melhores condições de vida do que a maioria.
Quando é que os melhores de um curso, de uma universidade, de um país, vão escolher dar aulas no ensino não universitário, quando a proposta do empregador é andar com a casa às costas 10 ou 20 anos? Se temos de ir para onde há trabalho (e eu concordo inteiramente com esta ideia) porque é que não podemos ficar onde há trabalho? Se eu entrar para os quadros de uma empresa, depois do devido período de experiência, fico na empresa até o posto de trabalho cessar. Se eu for professora concorro a um lugar e, apesar de 3 anos depois ainda haver necessidade de um professor da minha disciplina naquela escola, eu tenho que concorrer novamente para o território nacional inteiro e provavelmente não fico colocada na mesma escola. Onde é que está a lógica deste processo? Podia continuar a falar das condições de trabalho más, muito más, de muitos professores, mas depois ninguém lia este texto até ao fim.
Ninguém que queira enriquecer vai para professor, mas há mínimos que são aceitáveis pelos muito bons. Não percebo porque é que aqueles que ensinam os nossos filhos e lhes abrem os horizontes, lhes oferecem inúmeras possibilidades de vida e tanta inspiração não são os melhor tratados pela nossa sociedade. Não percebo. A consequência é que o sistema de ensino afasta à partida ou esgota gradualmente os melhores professores em potência.
A luta dos professores, dos alunos e dos pais devia ser conjunta pela reformulação do sistema de ensino, partindo de:
-          exigência muito alta nos critérios para aceder à docência;
-          boas condições de trabalho e respeito (sim, uma vénia dos decisores políticos ficava bem) para os professores.
 
Mas isto dava muito trabalho. Os pais e os alunos a colocarem-se no lugar dos professores, os professores a darem lugar aos melhores, etc, etc, dava muito trabalho. E, como diz o meu amigo de facebook:
JPG: Pois, é uma questão de prioridades na construção de um país. Uns preferem a educação, a saúde, o desenvolvimento, outros preferem construção anárquica, crédito desenfreado, estádios de futebol, auto-estradas à doida, aceitar subsídios para não produzir e etc. e tal...

sábado, 30 de junho de 2007

Porque é que estou aqui, doutora

Quanto mais pessoas se afastarem do Sistema Nacional de Saúde (SNS) pior ele fica. Quanto menos pessoas críticas e exigentes recorrerem aos cuidados de saúde do Estado, menos respeito pelos direitos de quem usa o sistema público haverá. E já hoje, quem vai ao público é, na maioria das vezes, quem não tem alternativa.
É esta a minha convicção e foi o que expressei à minha médica de família. Também a ela lhe custava crer que eu (bem vestida, informada e interrogativa) preferisse ter uma gravidez acompanhada no público, por um médico de clínica geral e não um obstetra.
Eu preferia ter um obstetra. A minha irmã, também ela seguida no SNS, teve um obstetra. O acompanhamento por parte do Centro de Saúde de Oeiras foi tão bom que foi detectado ao bebé uma arritmia quase inaudível, ainda quando o seu nome científico era feto.
Eu preferia ter um obstetra. Mas em Lisboa, os CS estão a deixar de ter obstetras e ginecologistas. Parece que o número de nascimentos não justifica. Quem tenha um problema uterino, quem passe por uma menopausa difícil, quem tenha outro problema desse foro ou vai ao privado ou espera dias e dias por uma consulta, mas uma gravidez não pode esperar, por isso, o médico de família encarrega-se das grávidas.
Eu poderia pagar as consultas no privado. Não seria fácil mas seria possível. Só que não me parece ético não exigir ao Estado que me dê algo em troca dos meus impostos. Nem me parece justo que eu, por ser mais rica do que a maioria da população, tenha direito a atenções que a maioria das pessoas não tem. Esta é a minha forma de fazer política. Nunca fiz greve e só vou a algumas manifestações. Mas exigir respeito, fazer valer os direitos e reclamar junto das entidades competentes são coisas que a maioria dos utentes do SNS não faz, não sabe fazer e não pode. Eu quero que se possa porque eu quero um sistema de saúde competente.