sábado, 30 de junho de 2007

Primeira vez na Maternidade

Uma hora à espera na zona das consultas da Maternidade do Hospital Dona Estefânia... mas não para ter a consulta, o que até podia ser razoável. Uma hora à espera para saber se ía ter a consulta nesse dia ou não... Depois de uma hora à espera resolvi perguntar se já se sabia se eu ía ter consulta ou não. A resposta na recepção foi: "Não se preocupe que não sai daqui sem consulta marcada". Pois, só que não foi isso que eu perguntei. Reformulei: "Eu quero é saber se a consulta é hoje ou noutro dia. Estou há uma hora à espera e como imagina tenho outros compromissos. Preciso de saber se os adio ou se os mantenho".
Bom, depois disto, mandaram-me falar com a enfermeira da sala tantos. Lá fui e a senhora, simpática sem dúvida, não podia fazer nada, não sabia nada. Mas a minha ficha continuava a descansar tranquilamente em cima de uma mesa, nessa sala, junto a outras credenciais. Eu expliquei mais uma vez que estava há uma hora à espera e que tinha outros compromissos. "Preciso de saber se os adio ou se os mantenho".
"Se quiser vá ali à porta e fale com a doutora. Eu não posso fazer isso," disse a enfermeira.
Muito bem. Estou de pé no corredor, onde está outra grávida, de fim de tempo, também à espera, também de pé... Estou diante de duas portas que têm indicação triagem. Quando a primeira se abre eu peço desculpa por entrar. Lá dentro estão 3 mulheres de bata branca e uma entra logo a seguir. As quatro estão muito contentes e numa animada cavaqueira.
"Peço desculpa por estar aqui, sei que não devia, mas estou há uma hora à espera para saber se tenho consulta hoje ou não. Só precisava dessa informação." Uma das senhoras, que é a médica, responde-me: "onde é que está a sua ficha?"
"Está na sala da enfermeira. Posso ir buscá-la". Conforme vou, entra uma paciente na sala, para a consulta. Mas pelo menos consigo meter a minha ficha lá dentro! Espero mais meia hora para saber. Mais meia hora com a outra grávida que está no fim do tempo. Estamos as duas de pé. E rimos... afinal, com o tempo que nos fazem esperar até parece que a licença de gravidez já existe.
Meia hora depois, sai a outra grávida entro novamente na sala. A médica pergunta-me se sou eu a Carla. "Sim, sou, vou ter consulta hoje?" "Sim, sente-se, atendo-a já". Neste momento penso, mas não digo, que devo estar a passar à frente a uma data de gente quando eu só queria saber se tinha consulta. Não foi o que eu pedi, mas enfim, que se lixe, já estou a ser atendida.
Conto a história de família que me leva a querer fazer o rastreio. Falo da leucemia da minha mãe e ela responde, ríspida, "mas isso não tem nada a ver" e eu digo "pois, mas eu não sei, não sou médica" e começa a peixeirada. A doutora grita comigo, que me está a fazer um favor, que me passou à frente de muita gente com consulta marcada, que vai fazer isto de forma meramente técnica. Voam papéis e a médica esbraceja até eu lhe gritar também (e mais alto) que ela não pode falar assim comigo e que eu não pedi favor nenhum. Ela ainda se queixa que tem imensa coisa para fazer e que não está para aturar isto, mas acalma-se. Eu não digo mais nada, mas penso.
Penso que raio de gente é esta que pensa ser a única classe profissional do mundo a ter muito que fazer. Estão sobrecarregados? Também eu e estou ali há muito tempo à espera e não é por estar grávida que o meu trabalho diminui. Penso porque é que temos médicos que não seguem protocolos e que gostam de fazer favores? Porque é que a minha ficha não foi para a triagem, cinco minutos depois de eu a ter entregue na recepção? Porque é que eu tive que andar pelos corredores e tive de chegar à fala com a médica e ocupá-la para conseguir ser atendida? Porque é que esta gente acha que está a fazer favores quando é das suas funções atender pessoas que recorrem ao serviço onde trabalha e é remunerada para tal?

Segunda parte: ecografia porcaria
Ainda na mesma consulta na MHDE, a médica vê a minha ecografia das 11 semanas e diz que é uma porcaria e faz mais considerações acerca das borlas dos acordos... Eu explico que paguei e que portanto não use esse argumento.
Então a doutora elenca um rol de profissionais privados que são muito bons. A Joaquina Tavares vem à cabeça (e sim, toda a gente fala bem mas a senhora cobra 110 euros pela mesma eco em que eu paguei 65) mas há mais. E eu suponho, pelas idades dos que conheço, que são todos colegas de curso... mas não faço comentários.
Porque é que numa consulta no SNS eu tenho direito a publicidade? Isto parece-me, no mínimo, duvidoso e tenho impressão que não é muito legal...

Saio da consulta resoluta a fazer uma reclamação por escrito. Tudo isto me pareceu abusivo. Eu não sou analfabeta e conheço os meus direitos. E depois faz-se luz... E se esta obstetra me encontra novamente nas consultas? E se é ela a fazer-me o parto? E penso: estou lixada. É melhor não fazer nada.
Lá vou eu, finalmente, fazer o rastreio. As enfermeiras são surdas (com excepção da estagiária que é muito querida e competente) mas isso também já não me interessa. Quero dar o sangue para análise e ir-me embora. Para a próxima gravidez tenho bebé em casa ou, melhor, vou para a Austrália, para o deserto.

E depois penso, isto é quase como ir para o privado. Eu tenho direitos. Se tenho medo de represálias, queixo-me de outra maneira: escrevo este blog para contar como é o SNS. Se não é todo igual, fica este exemplo. E no fim, daqui a seis meses, envio o documento inteiro para o Ministério da Saúde. Eu também tenho contactos!

Posso fazer o rastreio bioquímico?

A minha médica de família é extremamente cautelosa. Suponho que é por não ser especialista em gravidez. Quando lhe disse que sentia uma pressão do lado esquerdo da barriga, interpretou essa impressão como uma dor e aconselhou-me a fazer uma ecografia. Eu tinha contado dez semanas mas afinal, na ecografia, vimos um feto de onze. Só lhe faltava um bocadinho do queixo, de resto parecia uma pessoa completa.
Como era mais ou menos urgente, preferi fazer a ecografia a pagar. Num consultório com acordo com o SNS as vagas existentes só me permitiriam fazer a eco no dia 28 de Julho. Assim, consegui fazê-la duas semanas antes.
Felizmente estava tudo bem. O médico que realizou o exame explicou que era normal sentir esta pressão e que, apesar de ser cedo para ver a transparência da nuca, os outros sinais morfológicos (como o formato das mãos) indicavam um bebé saudável. Paguei 65 euros pelo exame, mas nem me importei. Estava tudo bem e o médico foi de um profissionalismo e de uma amabilidade excepcional.
Mesmo assim, na consulta seguinte, em já contava 12 semanas de amnorreia, pedi à médica para me prescrever o rastreio bioquímico. A minha família próxima tem alguns casos de malformações e mesmo que assim não fosse, acho que quanto mais se souber sobre a criança que aí vem, melhor preparados podemos estar.
Mas a minha médica preferiu enviar-me para a Maternidade do Hospital Dona Estefânia, com uma credencial para uma consulta e uma carta para o especialista que me assistisse. E foi depois disso que eu resolvi escrever este blog.

Porque é que estou aqui, doutora

Quanto mais pessoas se afastarem do Sistema Nacional de Saúde (SNS) pior ele fica. Quanto menos pessoas críticas e exigentes recorrerem aos cuidados de saúde do Estado, menos respeito pelos direitos de quem usa o sistema público haverá. E já hoje, quem vai ao público é, na maioria das vezes, quem não tem alternativa.
É esta a minha convicção e foi o que expressei à minha médica de família. Também a ela lhe custava crer que eu (bem vestida, informada e interrogativa) preferisse ter uma gravidez acompanhada no público, por um médico de clínica geral e não um obstetra.
Eu preferia ter um obstetra. A minha irmã, também ela seguida no SNS, teve um obstetra. O acompanhamento por parte do Centro de Saúde de Oeiras foi tão bom que foi detectado ao bebé uma arritmia quase inaudível, ainda quando o seu nome científico era feto.
Eu preferia ter um obstetra. Mas em Lisboa, os CS estão a deixar de ter obstetras e ginecologistas. Parece que o número de nascimentos não justifica. Quem tenha um problema uterino, quem passe por uma menopausa difícil, quem tenha outro problema desse foro ou vai ao privado ou espera dias e dias por uma consulta, mas uma gravidez não pode esperar, por isso, o médico de família encarrega-se das grávidas.
Eu poderia pagar as consultas no privado. Não seria fácil mas seria possível. Só que não me parece ético não exigir ao Estado que me dê algo em troca dos meus impostos. Nem me parece justo que eu, por ser mais rica do que a maioria da população, tenha direito a atenções que a maioria das pessoas não tem. Esta é a minha forma de fazer política. Nunca fiz greve e só vou a algumas manifestações. Mas exigir respeito, fazer valer os direitos e reclamar junto das entidades competentes são coisas que a maioria dos utentes do SNS não faz, não sabe fazer e não pode. Eu quero que se possa porque eu quero um sistema de saúde competente.

Correr para a 1ª consulta

No dia em que soube estar grávida - no dia em que fiz o teste que confirmou o que desconfiávamos - fui ao Centro de Saúde (CS) da Penha de França. Ainda não estava inscrita porque tinha mudado de casa há pouco tempo, mas lá consegui uma consulta para a médica de família que costuma dar as consultas relacionadas com a mulher (do planeamento familiar à menopausa).
Uma semana depois fui à consulta. Estava marcada para as 17h30 mas por volta das 15h00 telefonaram-me do CS e disseram-me: "então não vem?". "Vou" e acabei por ir mais cedo do que o previsto. Fiquei assustada com a possibilidade da médica se ir embora. Larguei o trabalho no escritório sem justificação razoável (ainda não queria que se soubesse), apanhei um táxi e meia hora depois estava no CS, muito nervosa.
"Agora não valia a pena ter vindo. A doutora foi fazer domicílios. A consulta vai ser à hora marcada." Foi o que me disse uma das funcionárias administrativas. À hora marcada tive a 1ª consulta... Porque é que me telefonaram a perguntar se eu não ía????