Dizer que José Saramago cometia erros gramaticais é tão estúpido como dizer que Luís de Camões escrevia com erros ortográficos.
O que José Saramago fazia ao escrever não era alterar concordâncias entre sujeitos e predicados, falhar na coerência verbal ou utilizar de forma errada advérbios, conjunções, complementos, frases relativas. O que José Saramago alterou apenas na forma de escrever português foi a pontuação. Usava sim a vírgula como pausa maior do que aquilo a que nos ensinam na escola primária e não sinalizava as falas com aspas e travessões – usava a vírgula para marcar a pausa.
O que Luís de Camões fazia e que se encontra amiúde nos Lusíadas (oh! essa obra fundadora!) era sacrificar os processos habituais de criação de palavras do português, substituindo-os por fenómenos possíveis mas alternativos, em favor da métrica, criando palavras novas. É claro, como ainda não havia ortografia estabelecida do português (o 1º tratado é de 1576) pode argumentar-se muita coisa, mas numa breve história da língua consegue perceber-se o que era normal e o que não era.
Ah! O que Eça de Queirós fazia muito era utilizar palavras estrangeiras inexistentes em português adaptando-as ou, por vezes, nem isso. Lembram-se do spleen da época?
Temos todo o direito de não gostar de Saramago, do Camões ou de outro qualquer. Aliás, temos todo o direito de não gostar de nada. Mas vamos tentar ser minimamente inteligentes quando tornamos as nossas opiniões públicas. As coisas que tenho lido na blogosfera são assustadoras, sobretudo porque são publicadas por pessoas que escrevem e acham que escrevem bem. Revejam lá a gramática! Ah! E a semântica!
2 comentários:
Felizes os pobres de espírito, deles será o reino dos céus. Não há paciência para tanta ignorância. Eu adoro Saramago e acho que os livros dele não se liam tão bem (nem de enfiada, como eu fazia quando tinha tempo) se tivessem a pontuação convencional. Bjs
Aplaudo este texto! Parabens por escrevê-lo!
CA
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